TOMEMOS POSSE DO ESTADO LAICO!

Tomemos posse do Princípio do Estado laico no Brasil.

Este artigo inaugura minhas reflexões  saindo da preguiça das férias, das delicias do ócio do veraneioo e do antidogmatismo do carnaval…

Neste carnaval proferi uma palestra em Campina Grande sobre “Direitos e Deveres da cidadania holística no Terceiro Milênio”, no Encontro da Nova Consciência. Onde explanei e debati o assunto que aqui ventilamos.
À guiza de introdução, vejo que você continua um ótimo exemplo de jovem advogado antenado e “ defendendo” veementemente as suas verdades. Isto é coisa de nós advogados. Defendemos as nossas verdades e até adotamos a dos “outros”.
Lembro que uma das defesas mais emblemáticas da historia da advocacia brasileira foi a que tinha como constituinte Luiz Carlos Prestes e como Constituído o Integro Advogado Sobral Pinto. Este católico de Carteirinha e aquele um comunista internacionalmente conhecido. Sobral apesar de discordar das teses e ideologia do seu constituinte, patrocinou uma veemente defesa contra o arbítrio, a opressão e repressão política do Governo Vargas ; amparado nos direitos dos animais e contra as penas cruéis, desumanas e degradantes. Ou seja, ele foi o prócer da Defesa dos Direitos Humanos para outro prócer representante da Internacional Comunista.
Mas hoje os tempos são outros. O cidadão contemporâneo – brasileiro, precisa ter em suas mãos para o pleno exercício da cidadania, alguns documentos que são construídos históricos, a exemplo da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 – DUDH; A Constituição Cidadã Brasileira de 1988; O Codigo do Consumidor de 1990 e o Plano Nacional de Direitos Humanos3 – PNDH3 de 2010.
Apesar de o Estado brasileiro ser laico legalmente, nota-se que na pratica ele não é!.
Basta apenas circularmos despretensiosamente nas repartições publicas e instituições do Estado ( Executivo/Legislativo e Judiciário), e logo vemos crucifixos e bíblias espalhadas nos ambientes públicos, isto sem falar do uso ilegal e indevido de equipamentos sociais e públicos.
Tais atos violam frontalmente o que prevê a nossa constituição:
é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias” (artigo 5º, inciso, VI, da CF).
Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I – estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público;
II ( omissis)
III – criar distinções entre brasileiros ou preferências entre si.

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (….)
 
A Constituição Federal de 88 não se limitou a proclamar, como direito fundamental, a liberdade de religião (artigo 5º, inciso VI). Ela foi além, consagrando, no seu art. 19, inciso I, o princípio da laicidade do Estado, que impõe aos poderes públicos uma posição de absoluta neutralidade em relação às diversas concepções religiosas. Este princípio não indica nenhuma má-vontade do constituinte em relação ao fenômeno religioso, mas antes exprime ‘a radical hostilidade constitucional para com a coerção e discriminação em matéria religiosa, ao tempo em que afirma o princípio da igual dignidade e liberdade de todos os cidadãos’ [Jônatas Eduardo Mendes Machado. Liberdade Religiosa numa Comunidade Constitucional Inclusiva. Coimbra: Coimbra Editora, 1996, p. 347] (3)
Vejo a explicita manifestação da fé católica/cristã em várias repartições que freqüento, bem como manifesta e exacerbada exposição da imagem dos governantes em filmes, jornais, posters e fotografias emolduradas, isto não fere o caráter Republicano e o Princípio da Impessoalidade e não se caracteriza um culto ao personalismo?

“Laico, no entanto, não quer dizer inimigo da religião. Etimologicamente, laico ou leigo provém do termo grego laikós, que designa o que se refere ao povo (laós). O termo leigo (laikós) serve apenas para diferenciar as pessoas consagradas para uma missão especial, tais como os diáconos, presbíteros e bispos, daqueles que são apenas consagrados no batismo (Dom Fernando Antônio Figueiredo, Introdução à Patrística, RJ, Editora Vozes, 2009, p. 46). Laico não designa, portanto, algo não religioso, nem contrário à fé, mas apenas aqueles que não exercitam como vocação, o ministério religioso. Estado laico não é Estado sem fé, ateu ou que se antepõe a símbolos de convicções religiosas, mas tão somente Estado não confessional, sem religião oficial ou obrigatória.”(1)
A rigor, o patrimônio público e seus representantes não podem vincular-se a opinião religiosa de quem quer que seja. O que vemos em nosso pais é uma invasão em tentativa de monopólio dos Espaço Público pelos católicas. Vemos até o uso indevido de carros de bombeiros carregando seus símbolos religiosos. O Ministério publico deve atuar ou no sentido de evitar a sua concessão de uso ou ampliar para todas as outras religiões o mesmo direito de uso, sob a ótica do Princípio da Isonomia.

O Brasil é um Estado Laico, o que significa que não se confunde com nenhuma religião, não adota uma religião oficial, permite a mais ampla liberdade de crença, descrença e religião. Com igualdade de direitos entre as diversas crenças e descrenças e no qual fundamentações religiosas não podem influir nos rumos políticos e jurídicos da nação (3)
O Estado Brasileiro por ser laico, necessariamente não significa que ele atenda aos preceitos ateus, simplesmente deve praticar a idéia de um Estado imparcial de caráter Republicano com relação ao sentimento religioso do cidadão, porém ao se permitir afixar símbolos religiosos em repartições publicas devemos estender esse direito a todas as outras religiões.
Porém todos sabem o quão é difícil e antipático realizar a tarefa de retirar do jovem Estado Brasileiro constitucionalizado há apenas 23 anos, os símbolos de expressões religiosas oriundas ainda da época da primeira república quando a religião oficial do Estado era a Católica, mormente quando a “maioria” dos servidores e autoridades publicas são dessa confissão religiosa.
Temos que fugir de nossa tendência patrimonialista e diferenciar o que é pessoal, do que é do Estado. O que é publico, e o que é privado. Precisamos construir o comportamento republicano no cotidiano da gestão publica. Qualquer servidor publico ou cidadão pode exercer sua fé, mas não é legal que este vá a uma repartição publica e pendure na parede (do Estado) o que a lei não prevê.
Assim, é inequívoco que o Brasil é um Estado Laico que veda: a confusão de Estado e qualquer instituição religiosa; a instituição de uma religião oficial; o estabelecimento de privilégios a determinada religião em detrimento das demais e, especialmente, a utilização de fundamentações religiosas para definir os rumos políticos e jurídicos da nação. (3)
Porque o servidor publico, só deve/pode fazer o que tem previsão legal. E o Ministério Publico grande aliado da cidadania e da Res-Pública, tem o dever/poder de atuar mesmo sem ser provocado para equalizar e isonomizar tais atos de ilegalidade, chamado o feito à ordem, garantindo o exercício do único monopólio a ser permitido em uma verdadeira democracia : o da Lei como expressão da conquista da Justiça!.
Alexandre Guedes
advogado/ filosofo e educador

Publicado por Alexandre Guedes

Advogado, Filosofo, Educador, militante e dirigente de organizações de Direitos Humanos. Especialista em Direitos Humanos, Civil, Consumidor,Administrativo, Eleitoral e Gestão Publica.

Um comentário em “TOMEMOS POSSE DO ESTADO LAICO!

  1. Bem vindo!!
    Sua argumentação me lembrou que há alguns meses entrei em um espaço público federal e me deparei com uma discussão interessante. Uma funcionária católica estava ofendida porque um outro funcionário trouxera para a sala de trabalho uma imagem de um Orixá da Umbanda. Entre gritos e insultos, resolvi o que precisava e sai da sala tentando entender que tipo de respeito ao diferente se pretende difundir em um espaço educacional público, laico e gratuito, já que o espaço a que me refiro se trata da UFPB.
    Dias depois ao retornar não encontrei mais a imagem do Orixá, mas junto a mesa da referida senhora ainda se encontrava seu santo católico de devoção…

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